Ah... Ana!
Esta roda que você abriu agora, me interessa. Já não sei se fazer parte dela é um passo de entrada ou é abrir os olhos e reconhecer-me em círculo. Não aquele círculo linear, infinito em sua jaula, mas este círculo dos cactos, que pontuam o espaço com suas presenças e o preenchem com suas fluências, telepáticos. Sobre esta poética posso dizer alguma coisa concreta, mesmo não sabendo dela por inteiro.
É comum a pergunta: vocês do Corpomancia são em quantos? Você mesmo me perguntou n'outro dia. Ontem foi a vez da Fran tentar responder, quando se apresentava em uma oficina que estamos fazendo. A resposta dela foi a mesma da minha para você, inexata. Não sabemos quantos somos, quem somos exatamente. Olhe para nós duas agora, se não somos daqui também, mesmo que não estejam todos, mesmo que venham muitos outros. É uma linha delicada esta que te traz o medo do corporativismo, e este seu medo vem me fazendo refletir sobre as nossas redes por aqui. A imprecisão da resposta da Fran me norteou uma calma a este respeito, veja só. O próximo bailarino se apresentou como integrante do Corpomancia, e eu pouco o conheço, achei bom. Sinal de que somos uma rede aberta a conexões. Mas quero dizer de outra qualidade também.
Não se trata de um desgoverno. Criamos propostas que tomam corpo e aproximam corpos que se interessam, e às vezes eles não se interessam mais, e outros entram - outros permanecem. É um movimento natural este, que acontece também em sistemas que se vêem mais fechados, e por se verem assim, adicionam um certo sofrimento às chegadas e partidas.
Às vezes fica mais fácil pontuar o que as coisas não são, ou tecer uma dezena de afirmativas pra tentar moldar o que se é, mesmo que soe exagero. Não é corporativismo. Não é desgoverno. Não é insegurança de não saber o que é. É confiança nas possibilidades que podemos construir. É prontidão. Escolha. Democracia. Escuta. Ativismo. Movimento. Ser silêncio. Estar necessário. Buscar descobrir. Perceber o momento. Retirar-se. Entender seus papeis. Variar os papeis de acordo com as possibilidades. Perceber necessidades. Estar presente. Aí eu te pergunto, Ana, se esta experiência aqui reinventada com as palavras, não chega perto da composição em tempo real?
Nesta oficina que participo, ministrada pelo Geraldo Si, o que me cava a atenção é perceber justamente a prontidão de quem participa, o estado que se entra para compor. O ânimo >> pausa para o dicionário googlemaníaco:
ânimo
substantivo masculino
- 1.espírito pensante; alma.
- 2.índole natural; gênio, temperamento.
"é pessoa de â. cruel"
Isto que antecede o movimento da rede me interessa. O que nos faz conectar, o que torna as conexões potentes. O espírito pensante, a coragem, a vontade, o temperamento, e acrescento aqui o estado de prontidão e talvez uma curiosidade, porque ela pressupõe um não saber, com uma cobertura de aventura e um recheio de inteligência, vc não acha?! Isto que antecede o tecer da rede me interessa justamente porque estou buscando em mim estes motivos de conexão. Estas palavras bonitas que inspiram a ação. Quando a gente é bem jovem, a gente se move por instinto, por frescor, por vigor. A Suely Machado, em uma das vezes que trouxe o seu Primeiro Ato à Campo Grande, disse que gostava de trabalhar com bailarinos bem jovens ou mais maduros, os de trinta não. Começo a entender Suely, nos meus trinta e quatro.
Sobre o seu gasto de energia com quem não quer criar conexões, lembrei do Leandro Karnal, em um destes vídeos postados no Facebook, impossíveis de se localizar por busca, que disse alguma coisa como: uma pessoa só se põe a escovar os dentes com vontade própria quando vem o desejo de beijar; antes disso é um gasto de energia dos pais em tentar ensinar o filho.
Aproveito pra dizer que vc foi muito generosa em dizer que aprendeu no nosso contato, na construção do nosso artigo, porque obviamente, quem saiu no lucro do aprendizado fui eu, sorry. Mas você tendo esta qualidade da curiosidade com cobertura de aventura e recheio de inteligência, fez ecoar aqueles escritos, conectivou o que era conectivo por natureza, e quero dizer que fiquei bem feliz em saber que tomou vida própria, vida bonita.
E você, quais foram as conexões mais fortes com a nossa construção na sua experiência no México?
Quero saber por aqui também.
Beijos, querida, sim, com muito afeto.
p.
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