8 de ago. de 2012

um percurso de Inocência

foto Helton Pérez

O primeiro estímulo para a criação deste trabalho veio em 2006, quando os organizadores do lançamento da edição comentada do livro INOCÊNCIA, por Hildebrando Campestrini, entraram em contato com a Ginga Cia de Dança para pedir uma colaboração para o evento. Eu fazia parte do elenco da Cia e tinha uma relação de carinho com o livro porque meu pai, Esacheu, coleciona edições antigas desta obra de Taunay. O projeto não aconteceu, mas aquele estímulo ficou guardado e nos anos seguintes, ressurgiu em criações de videodança e trabalhos para a pós-graduação.

Algumas tentativas foram feitas para a construção deste espetáculo, com colaboração de Júlia Aissa, Renata Leoni, Mary Saldanha. Em 2011 engatamos pesquisas para Inocência, eu e a Renata, em  estudos teórico-práticos, além de aulas de kung fu com o Dirceu Coelho. Havia também debates com a Mary, que já pensava a cenografia e figurino dessa proposta.

Neste momento a figura da Re ganhou peso no imaginário do espetáculo: tínhamos ali uma mulher madura, em contraponto com a figura adolescente da personagem do livro. Se estávamos falando da passagem do tempo (o livro foi publicado em 1872), a presença da Re trazia o debate para a cena contemporânea. Um dia, ela veio ao ensaio contando que o seu filho, Guilherme, tinha dito pra ela: «mãe, deixa eu te explicar de um jeito que você entenda..». Conheço o Guilherme desde 2001. Ele entrava no carro explicando cientificamente as coisas, e a sua sabedoria ‘inquestionável’ nos fez refletir sobre o lugar da inocência dos dias de hoje. O «Nauth» (seu apelido), aceitou o convite para entrar no espetáculo, sua primeira experiência cênica,  dizendo: «ok, eu não me importo em subir no palco».

Recebemos com entusiasmo o resultado do Prêmio Klauss Vianna no fim de 2011. Junto com ele, a notícia de que eu estava grávida: me transformei em casulo. Essa  metamorfose abriu espaço para a Camila Emboava, bailarina que chamamos para construir o trabalho porque ela acompanhava a trajetória do Conectivo, e é uma pessoa com quem temos grande afinidade. Na primeira conversa estava claro: ela era a própria Inocência. Ao longo da nossa convivência, fomos descobrindo suas questões e trazendo-as para o corpo, para o debate, para a composição da dança. Foi bonito acompanhar esse processo da Camila, e constatar mais uma vez que a arte surge do esforço.

A Franciella Cavalheri veio somar ao processo com seu olhar sempre atento às questões do corpo, preparando estímulos para aprimorar o conteúdo gerado nos ensaios. Todas nós fizemos  aulas de tai chi e kung fu com o Dirceu Coelho e assim podemos afirmar que este trabalho surgiu a partir da pesquisa de movimento, em um processo colaborativo de criação, em todas as suas camadas (design, cenário, figurino, dança, produção).

Contamos com a colaboração de alguns especialistas para aprofundar os conteúdos que estávamos tratando. Conversamos com Hildebrando Campestrini sobre a sua pesquisa do livro e de Taunay; com a dra. Nazira Scaffi, que além de nos dizer sobre o açúcar, trouxe indagações filosóficas sobre o trabalho e o livro; com a professora Maria Adélia Menegazzo, contextualizando a obra na literatura brasileira, e com Clarissa Araújo, bióloga que realizou uma pesquisa sobre borboletas e espécies encontradas aqui em MS especialmente para o Inocência.

A produção da Arado Cultural, liderada neste projeto pelo Marcos Mattos, nos trouxe uma organização fundamental para o Inocência: eles correram atrás de tudo! E sempre com um carinho tão grande que deram um ar de leveza aos malabarismos necessários em um projeto como esse. A parceria cultural com a Cia Dançurbana nos garantiu também um local de trabalho que nos aconchegou.

Temos agora mais uma obra em dança que, como o livro de Taunay, olha para questões de pessoas que vivem neste lugar que muitos enxergam como um «vácuo», como era chamado o atual Mato Grosso do Sul. Esta é uma tentativa de preencher com matéria corporal o espaço que habitamos. Com afeto, tentando escapar das armadilhas dos nossos casulos de açúcar.

Um comentário:

  1. Parabéns pelo belíssimo espetáculo de ontem! E que maravilha poder ver a Renata Leoni dançar!

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