Na
construção do projeto “Sem Cerimônia – ser cidade”, elaboramos intervenções de
dança contemporânea relacionando o corpo com a cidade e seus monumentos para provocar
um ruído na rotina urbana e questionar a fronteira entre movimentos cotidianos
e dança. O projeto foi aprovado no edital nacional do Prêmio Funarte Artes na
Rua 2011 e as intervenções aconteceram pela primeira vez no centro de Campo
Grande como parte da programação da 7ª Aldeia SESC Terena de Arte e Cultura em
2012. Também integraram o programa da Bienal de Teatro de Campo Grande em 2012
e do Festival América do Sul, em Corumbá, em 2013.
Em
Miranda, alunos de uma escola acompanharam as intervenções, que terminaram com
a Renata desenhando com giz branco uma linha reta no chão para brincar de
equilíbrio. Depois de percorrer a trajetória da linha, ela escreveu no chão a
frase “tudo que é sólido desmancha no ar”. Então as crianças também receberam
giz branco e, como era de se esperar, começaram a interferir no cenário, uma
praça no centro da cidade. As crianças escreveram e desenharam com giz nos bancos
de cimento coloridos. No dia seguinte,
soubemos que a escola tinha recebido ordens agressivas do Secretário Municipal
de Educação para limpar a praça mediante
ameaças de processo por depredação ao patrimônio público.
Nós,
artistas e produção, com panos e baldes, limpamos as inscrições em menos de
cinco minutos. Giz apaga muito fácil. Já a acusação por depredação, embora não
tenha sido formalizada e nem mesmo verbalizada diretamente aos corpomantes, não
apagou fácil. A verdade é que voltamos para Campo Grande indignados com essa
situação.
Vivemos
em espaços e sintonias diferentes. Respeitamos a diversidade dos olhares. É
possível que pequenos ruídos sejam interpretados como grandes explosões de
acordo com a sensibilidade, experiência e discernimento do ouvinte. Tudo bem. Ainda
assim, acreditamos que enxergar depredação na nossa performance e contestar a
escola por conta disso foi muito impróprio e inconveniente.
Nestes
tempos de desespero e alerta, é bom lembrar que nem tudo é vandalismo. Depredar
é estragar. Intervir é tomar parte, apropriar-se. Nesse sentido, temos clareza
de que o que fizemos não foi um estrago e sim uma intervenção artística. Não
poderíamos nos desculpar pelo mau jeito e a impertinência. É que uma das
funções da dança contemporânea é provocar reflexões, questionar papéis,
desafiar o que está posto. Essas certezas tão sólidas nas quais você se segura.
E que desmancham no ar.
Fotos da Jackeline Mourão.
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