“Refletir é preciso, refletir não é preciso”
O crítico Roberto Pereira, em artigo publicado no Jornal Correio do Estado em 3 de setembro de 2007, diz “É Preciso Refletir sobre a Dança”. No artigo, Pereira conjecturava sobre a Dança em Campo Grande, Mato Grosso do Sul, por ocasião do evento comemorativo do aniversário da cidade, o Dança Campo Grande, em sua 11ª Edição.
E para que refletir? Porque em dança (arte) nos deparamos com a dificuldade de classificar cada prática, cada idéia, cada pensamento. Nossas gavetas muitas vezes se misturam, ou nem isso. E por definição, refletir é ponderar, observar, sopesar, contrapor, pensar maduramente, analisar e depois organizar pensamento e ação num sistema coordenado. Entanto o ambiente da dança é sempre fluído, impalpável, complexo e plural, avesso por isso à sistematização.
Se é preciso refletir, o nosso ponto de partida será a inquietude, o sentir-se provocado, desafiado, lidando com o perigo, com o desconhecido, com o medo no corpo (como diz o Júlio, bailarino da Ginga Cia de Dança). Desse caldeirão de sortilégios surge a idéia em movimento, a impressão do corpo na dança e a impressão da dança na mente do espectador.
Dançar, portanto, é ir ao encontro do desconhecido. Temos as nossas referências, nossos mapas, nossos mestres, nossos instrumentos, o nosso Argos e os amigos argonautas. Ao longo da viagem, nos deparamos com Esfinges cruéis: decifra-me ou te devoro!: O que é dança? Qual é a minha dança? Existe a dança de cada um? Existe a dança comum? Existirá o “dia certo e preciso, de toda gente cantar / dançar” (Gilberto Gil, em Louvação, com a nota de que quando todo mundo canta, todo mundo está dançando).
“Navegar é preciso, viver não é preciso”.
Autoria: Renata Leoni
Colaboração: José Carlos Gomes
É preciso acrescentar que o verso "Navegar é preciso, viver não é preciso" é do poema homônimo de Fernando Pessoa, inspirado na frase latina de Pompeu, O Grande: "Navigare necesse; vivere non est necesse" - Pompeu foi um general romano, que viveu entre 106-48 aC., e a frase foi dita aos marinheiros, amedrontados, que se recusavam viajar durante a guerra, cf. Plutarco, in Vida de Pompeu.
ResponderExcluirPenso , penso , mas quantas vezez reflito??
ResponderExcluirFico cheia de impressões boas, quando escuto pessoas refletindo a dança.
Fico mais cheia ainda quando a reflexão provoca concavidades nos artistas da dança.
Parabéns pelo texto!!
Ôxe! Que texto bom!!
ResponderExcluirTenho que ler mais umas 5 vezes para incorporá-lo.
Mas a minha caixinha mais guiada e embebida pela emoção já tascou o olhar e se sensibilizou.
Mto obrigada, Renata!
Tava pensando... além de necessário e impreciso (tanto assim?), é uma questão URGENTE também refletir sobre dança, se a gente pretende continuar trabalhando com ela.
ResponderExcluirLincando com o texto da Neide Garrido, também colega de sala nossa, ela fala sobre crise de credibilidade na dança. Acho que o texto da Re responde um pouco isso com a questão da imprecisão na reflexão dessa arte.
Acho que credibilidade tem a ver com segurança e essa imprecisão tem a ver com falta de segurança em saber "isso é dança", "dança é assim". A dança não tem mais limites porque o mundo não tem mais limites."Viver não é preciso", não é? E cabe a gente olhar para o caminho, para os jeitos de navegar (dançar, viver), para o processo, e pesar se a dança tem ou quer ter um porto final.
E daí a gente começa a buscar a tal segurança no pensamento, na proposta, na certeza de que as coisas se transformam.
O que é a dança, dona Esfinge? a dança é crise em movimento, eu diria às 10:14 do dia de hoje, agora, precisamente. Ela me devoraria? Se eu to errada e só tem uma resposta para a sua pergunta, então me explica, dona Esfinte, e depois disso me devora logo. Porque daí viver (dançar) não vai mais ser preciso (necessário) mesmo.
Permitam me expor a minha inquietação com relação a arte e a luta em não escrever com relação à determinados assuntos. Mas cativo as palavras, me recuso a ficar quieto.
ResponderExcluirO que percebo com relação a refletir a dança, seria num sentido mais longincuo. Eu diria que tanto o homem das cavernas quanto o ser moderno, expunha e expõem sua dança na necessidade de suas ações. Sabia o homem cavernoso que, para conquistar sua senhora, deveria dar-lhe uma cacetada na cabeça e puxá-la pelos cabelos para dentro da caverna.( digo isso sem refer~encia ao maxismo). Do mesmo modo, como faria para caçar e outras funções.
Hoje, quando ouço um barulho dos garis no chamado "caminhão do lixeiro", imagino os homens modernos dançando no entorno do caminhão e na frente dos quintais. Pensei outro dia num título assim "Andanças e Mudanças", porque tudo gira em torno dessa ação que muitas vezes ainda é desconheçida.
Vejo o futebol, os pássaros pulando por sobre o muro, as minhocas se debatendo, a água dos rios em movimento, as núvens. Tudo é uma ação, uma dança. Desta forma busco desvendar o que "a dança consciente e a não consciente, ou ainda o que é artístico e não". Acho que aí é que mora o "X " da questão
Penso então, para ser breve que, refletir a dança seja mais que entender suas teorias ou necessidades, ou ainda classificá-la em contemporâneo, classico e..., mas sim qual a dança é exercida hoje.
A meu ver e talvez parodiando algum pensador: "tudo é dança", desde almoçar, escovar meus dentes, beijar, transar. Acho que até o corpo frio num velório a espera do sepultamento exerce a dança silenciosa, por que me diz algo e me faz pensar.
Qualquer ação que me faça pensar, ou repensar e que me faça meus olhos piscarem, passa a ser dança.
Mas não quero pensar muito com relação a isso,porque, como dizia meu velho avô " Quem muito pensa, nada têm". Então chega de pensar e vamos dançar que a gente ganha mais.
E tenho dito
Espedito Montebranco
Renata;
ResponderExcluirParabéns!
Você me fez pensar em dança, em movimento, em corpo, em estudo e pesquisa, dentro da academia - onde se busca organizar, interpretar e conceituar o que vem das ruas - ou fora dela, de onde vem o "conhecimento".
Percebo também que você não fala apenas em coreografia que as vezes confundimos com dança; vai além, talvez na mesma inspiração do "Dançar a Vida" de Roger Garaudy, dos rituais tribalistas ou das celebrações dionisíacas, nos aproximando do sagrado . É preciso "esticar" a mente pra entender que a Arte é um dos instrumentos mais refinados da manifestação humana e porisso é necessária e que dançar faz parte das coisas que nos colocam em contato com O OUTRO e não o digo apenas pra provocar empatia mas por sentir que quando dançamos não o fazemos apenas por nós ou para nós, mas por todos aqueles que se sentem incapacitados(o que é uma pena). Isso me faz pensar que cada um de nós tem a sua própria dança mas também tem em si a DANÇA DO OUTRO. Não será isso que deixa maravilhado a quem nos assiste? não será isso motivo suficiente para aprimorarmos o nosso corpo, desenvolvê-lo e principalmente amá-lo? Se dançamos a DANÇA DO OUTRO ou PELO OUTRO, é com o nosso corpo-sentimento que o fazemos, então pra mim é fácil deduzir que o dançarino tem um CORPO COLETIVO e será melhor que esse corpo seja íntegro e que essa dança seja honesta para então chegarmos a algo que talvez seja o mais importante, uma DANÇA COLETIVA, não excludente. A partir daí, cada estilo ou técnica, cada conceito ou biotipo é o que menos importa, apenas um motivo e que seja um bom motivo.
Penso que vale a pena a reflexão sobre a Arte e sobre a vida, desapegados, sem sofrimento, vislumbrando novas possibilidades, afinal a Arte pode ser efêmera, sobretudo as Artes Cênicas, porque a Criatividade é infinita.
Jair Damasceno